quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007
Pelo próprio:
dois poemas de Fernando Assis Pacheco
A Profissão Dominante
Meu Deus como eu sou paraliterário
à quinta-feira véspera do jornal
nadando em papel como num aquário
ejectando a minha bolha pontual
de prosa tirada do receituário
onde aprendi o cozido nacional
do boçal fingido o lapidário
- fora algum deslize gramatical -
receio que me chamem extraordinário
quando esta é uma prática trivial
roçando mesmo o parasitário
meu Deus dá-me a tua ajuda semanal
Fernando Assis Pacheco
A Profissão Dominante, 1982
PRANTO POR MANUEL DOALLO
Podia-se ter esborrachado qualquer 23 de Agosto
véspera do San Bartolomé e ele na moto
correndo de Vitoria para as mozas de Ourense
e para as tazas em que era ainda mais exímio
e deixa-se morrer unha serán poñamos
por caso desolada agora pai de filhos
a última queixa: que lhe doía um braço
en troques há tanto sacana que parece de ferro
vaite ó carallo ó morte que me levas
o meu primo galego Manuel Doallo
morte merdeira
coisa ruim de cinza e névoa e cinza
nem nunca nestas terras se me eu lembro
houve um outro rapaz de tanto garbo
como il que era cáseque um rei e querem
que eu o chore e ao coração coitelo?
barqueira que mo levas puta infame
eu berro e berro à soedá do rio
Fernando Assis Pacheco
A Profissão Dominante, 1982
Referendo «Cuidado com as imitações!»
Sérgio Godinho pôs a circular este comunicado. Urge espalhar a notícia:
Desde já, neste caso enganaram-se, não só na intenção, mas no próprio título da canção.
Espalhem a notícia.
ESPALHEM A NOTÍCIA ou CHAMEM A POLÍCIA ?
Acabo de receber, por vários amigos, a notícia: um "blogue do não" usou nas suas páginas uma canção minha, para, em última análise, promover os seus pontos de vista em relaçao ao referendo de Domingo.
Para mim, não é um assunto novo. Muitas vezes, canções inteiras foram usadas em contextos ampliados — e muitas vezes amplificados. E muitas outras se apropriaram de frases minhas para dizer — e pensar — outras coisas. Goste ou não goste (e gosto várias vezes) acho que tudo isso faz parte de qualquer acto creativo. Se não o quisesse expor a esse risco, guardava-o na gaveta.
Só que há limites, claro.
Desde já, neste caso enganaram-se, não só na intenção, mas no próprio título da canção.
Em vez de "Espalhem a notícia" deviam ter posto (e postado) "Chamem a polícia"...
A minha canção é uma elegia à qualidade da vida, e também à alegria consciente de dar à luz um novo ser.
Nada que se pareça com humilhação, falsas promessas de apoio a gravidezes indesejadas, sugestões de trabalho comunitário para substituir penas de prisão, e outra pérolas que tais.
E sim, sim à vida que a canção exalta e reconhece.
Espalhem a notícia.
Sérgio Godinho
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